31 de out. de 2014

Conto: Medo

 Eu sempre tive medo. De tudo. Não sei dizer quando foi a última vez que saí na rua sem pensar que algo de ruim poderia acontecer. Nem sei se isso chegou a acontecer. Afinal, quando eu era bem pequeno já ouvia meus pais me pedindo para ter cuidado, para não aceitar presentes de estranhos e para voltar pra casa quando começasse a escurecer.


 Os anos foram passando e as preocupações foram aumentando. Nunca lidei bem com isso. Até hoje não entendo como os políticos podem fazer tão pouco pelos cidadãos que os elegeram, como a polícia pode se corromper facilmente deixando você sem ninguém para confiar, ou como as pessoas arrumam coragem para apontar uma arma na sua cabeça, na frente da sua esposa e filhos, só para roubarem seu carro. É como se nada mais fizesse sentido.
 Talvez, mas só talvez, as histórias em quadrinhos estejam certas quando dizem que a sociedade precisa de um símbolo de heroísmo e confiança. De alguém que represente o bem e passe segurança para as pessoas comuns. E é por isso que estou aqui hoje. Aliás, é por isso que vocês estão aqui.
 Vocês ajudarão a trazer esperança para a sociedade. Por tanto, sejam gratos por terem escolhido esse dia e horário para virem ao banco. E não tem motivo para se preocupar, eu não vou roubar um mísero centavo de vocês. Vou pedir apenas para que se sentem ao lado daquele balcão enquanto eu amarro este explosivo em vocês. Enquanto seus pedaços estiverem voando pelo ar, as pessoas sentirão pavor, ódio, tristeza. Mas logo a polícia virá atrás de mim.
 Eu fugirei antes de vocês explodirem, mas deixarei pistas para que me achem em um dia ou dois. Até lá, o caos tomará conta da cidade. Notícias sobre ataque terrorista no banco central se espalharão pelos principais jornais do mundo. Mas quando me capturarem, tiverem certeza que eu fui o culpado de tudo, e me executarem na frente de uma câmera, as pessoas se sentirão aliviadas. Saberão que as autoridades têm a capacidade de prender e dar o castigo necessário a qualquer louco que surja. Poderão comprar pão na padaria sem sentir medo.
 Bom, está na hora de ir. Usem os últimos minutos para refletirem sobre isso. E parem de chorar, seus familiares ficariam orgulhosos se soubessem da atitude nobre que vocês estão tomando. Adeus.

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