6 de out. de 2014

Conto: João-de-Barro

 Era um dia ensolarado de primavera, as flores exalavam seus perfumes e os pássaros cantavam. A sacada de Arthur ficava no 38° andar do único prédio da região, por isso era possível enxergar a reserva florestal inteira. Arthur sabia apreciar a natureza.

 Naquela manhã ele acordou mais cedo. Preparou duas xícaras de café quentinho, as colocou em uma bandeja e se dirigiu à sacada. Sentou-se em uma das cadeiras, pegou seu binóculos e ficou observando os pássaros. Sua mulher Lúcia, apareceu de repente. Ela ia dizer algo sobre o susto que levou ao acordar e não encontrar o marido na cama, mas Arthur pediu gentilmente para que ela fizesse silêncio e se sentasse perto dele.

 Lúcia se acomodou, tomou um gole de seu café e, antes que pudesse perguntar o que estavam fazendo na sacada tão cedo, Arthur lhe entregou o binóculos e pediu para que ela observasse os pássaros. Contou a ela que aquela casinha encima do galho tinha sido construída por um joão-de-barro. Explicou que ele construía a casa junto com a fêmea e tentou mostrar quão segura ela era. A mulher abriu um sorriso, pois achava muito fofa a paixão de seu marido pelos pássaros, mesmo que ela não tivesse interesse algum nesse assunto.

  Arthur começou a contar que, quando ele era criança, ouvia lendas dizendo que quando o joão-de-barro era traído, ele trancava sua esposa dentro do ninho e a deixava lá para morrer. Lúcia perdeu o sorriso e seu coração acelerou. Discretamente, ela desviou os olhos para o colo do marido e encontrou um bilhete. Ela tentou parecer tranquila, mas seu cônjuge parecia estar sempre um passo à frente. "Não se preocupe Lúcia, eu não sou um joão-de-barro".

 O homem terminou seu café, puxou um cronômetro de seu bolso e o entregou para sua companheira. "Dizem que o serviço de emergência desta cidade é muito demorado. Vamos ver se é verdade", disse Arthur calmamente. Lúcia estava tremendo. Seu marido se pendurou na grade da sacada, sentiu o vento no rosto, respirou fundo e saltou. Lúcia ligou imediatamente para o resgate. Já não havia mais esperanças para o homem, mas a mulher descobriu que a ambulância levava três minutos e trinta e dois segundos para chegar ao seu apartamento.

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